Dec 23, 2007

NY Diaries 22: A Cidade Onde Acontece

Nova Iorque não é apenas uma cidade onde as coisas acontecem, é, também, uma cidade onde se faz acontecer. Nesta época de balanço e de celebração, pagam-se os bónus à banca, festeja-se o alcançar de objectivos, estabelecem-se novas metas e volta-se a começar do zero. A juntar aos inúmeros eventos típicos desta altura do ano, sentimo-nos todos um pouco numa maratona a terminar os pendentes antes de irmos de festas.

Que os Nova Iorquinos são impacientes, é uma asserção feita por Americanos e pelo mundo. Nós, por seu turno, nem reparamos, não fossem os amigos doutras paragens comentarem o facto. Um exemplo último da falta de tempo e, sem dúvida, da falta de espaço, é a casa automática, ou Push Button House, pelo arquitecto Adam Kalkin, que está até ao dia 29 de Dezembro no Centro Time Warner. Tinha posto na minha agenda uma visita obrigatória, mas como em dias de contagem decrescente para a partida a necessidade fala mais alto, foi preciso um livro difícil de encontrar levar-me a uma livraria de Columbus Circle para a ver ao vivo. O Illy Café serve espressos num espaço que em noventa segundos se converte de um contentor numa casa, com cama, balcão, sala com estantes e mesas.

Estou prestes a fazer a travessia do Oceano para a visita Natalícia às origens e nesta altura reflicto sobre as diferenças entre os Estados Unidos e a Europa. Aqui é um lugar-comum designar a Europa no colectivo, em vez de identificar um país em particular, e até nós, europeus acabamos por o fazer também. Se por um lado, a Europa está realmente próxima dos Estados Unidos por razões históricas, há também muitas diferenças, mesmo entre cidades irmãs como Londres e Nova Iorque. Por exemplo, na América o mecenato assume uma dimensão fulcral na dinamização das artes e da sociedade em geral. O facto de Nova Iorque ser actualmente o centro artístico por excelência, deve-se sobremaneira a uma tradição de patronato que remonta ao final do século XIX. Em conversa com uma das pessoas que curou a exposição do Richard Prince patente no Guggenheim, Inglesa e que conhece os meios artísticos em ambos os lados do Atlântico, verificámos que na Europa há um sentimento que o Estado deve ser o mecenas último dos museus e incentivador das artes. O indivíduo, em geral, inibe-se de efectuar contribuições avultadas, salvo raras excepções. Aqui, essas excepções são a regra. A grande parte do espólio dos museus de Nova Iorque constituiu-se à base de doações. Por exemplo, a exposição Age of Rembrandt: Dutch Paintings in the Metropolitan Museum of Art apresenta uma das maiores colecções de pintura flamenga fora da Holanda, com 228 quadros exclusivamente provenientes de dádivas ao MET. Há uma noção de responsabilidade pelo bem colectivo que é intrínseca ao indivíduo e que se denota em todos os campos. São exemplos disso a Fundação Gates, no campo da medicina, ou a Baryshnikov Dance Foundation, no campo da dança e das artes, para nomear apenas alguns casos.


[Publicado no Semanário Económico - 21 de Dezembro, 2007]

Dec 15, 2007

NY Diaries 21: O Natal em Nova Iorque

O Natal em Nova Iorque é magia, é o verdadeiro "White Christmas" que desperta inúmeras memórias de criança, quando, para vislumbrar o verdadeiro natal branco dos livros de histórias, era preciso viajar para outras paragens fora da Lisboa habitual. Aqui faz frio, a cidade cobre-se de branco quase todos os anos por esta altura e combinam-se visitas aos ringues de patinagem no gelo em Centra Park, Bryant Park e Rockefeller Center.

O Natal começa oficialmente com a cerimónia da iluminação das árvores no final de Novembro. Há várias espalhadas pela cidade, no Lincoln Center, no Madison Square Park, onde decorreu a primeira cerimónias de iluminação da árvore de Natal da América e, claro, a universalmente conhecida árvore no Rockefeller Center. Os próprios prédios são árvores de Natal gigantes, transformando Nova Iorque num enorme bosque enfeitado.

Mas Nova Iorque também é diversidade. Aqui desejam-se boas festas e não feliz Natal, a árvore de Natal é muitas vezes chamada de árvore das festas ou Holiday Tree, para que todos se sintam representados e para que as decorações festivas sejam realmente para todos. Nesta altura do ano, os símbolos cristãos e pagãos convivem com outras tradições que, aqui, adquirem especial importância devido ao tecido cultural da cidade. Nesta época a religião judaica celebra o Hanucá, ou Festival das Luzes, instituído por Judas Macabeu e seus irmãos para comemorar a libertação de Jerusalém do domínio selêucida e a purificação do templo sagrado. Nas montras e entradas dos prédios de Nova Iorque as árvores de Natal e as renas coabitam com o Chanukia ou Menorá, um candelabro para nove velas. Este ano, o primeiro dia do Festival das luzes calhou a 5 de Dezembro e dura oito dias, durante os quais se acende uma nova vela cada dia para celebrar o milagre original aquando da libertação do templo, em que a Menorá permaneceu acesa por oito dias com o azeite consagrada para um dia apenas. Por seu turno, o presépio mais proeminente na cidade é o presépio barroco do Metropolitan Musem of Art que todos os anos é recreado com as peças do século XVIII provenientes de Nápoles.

Nova Iorque transforma-se ainda na cidade de cristal com a estrela Swarovski no topo da árvore do Rockfeller Center e do enorme floco de neve UNICEF feito de 16.000 prismas de cristal Baccarat no topo do cruzamento da 5.ª Avenida com a Rua 57. As grandes lojas como o Saks ou o Bloomingdales lembram verdadeiros musicais de Hollywood dos tempos de Fred Astaire e Ginger Rogers, cobertas numa profusão de luzes e com montras decoradas como palcos de teatro ou encenações de bailes de máscaras.

Outra tradição bem Nova Iorquina, são as gorjetas dadas por esta altura com as boas festas aos porteiros e pessoal dos prédios residenciais. Também se recebem cartões de Natal, por vezes inesperados, como o que recebi esta semana do "Pai Natal" que me deixa o jornal à porta todas as noites. Além de tudo isto, as festas, por caridade, porque é Natal, enfim, porque aqui nunca são necessárias grandes desculpas para se festejar e estar com o chamado Holiday mood.

[Publicado no Semanário Económico - 14 de Dezembro, 2007]